Comentários à respeito do PLS 229/2009



O PLS 229/2009, recentemente, aprovado pelo Senado Federal (07/06/2016) e agora em tramitação na Camara Federal traz inúmeras inovações frente a Lei 4320/1964. Algumas delas induzem à melhoria da qualidade dos gastos públicos tais como: (a) a determinação de que, na aprovação da LOA, eventual incremento de receita, acima do fixado na LDO, deve ser incorporado na Reserva de Contingência (Art. 29); (b) permissão para carregar dotação orçamentária de um ano para o seguinte, criando possibilidade de maior controle e transparência nas dotações para investimento de grande magnitude (Art. 37, §5º). No entanto se aprovado, na redação atual, trará grandes dificuldades para a execução orçamentária. Destacamos a seguir os principais problemas.

a) Conceito de Receita Orçamentária (Art. 2º)

"XIII - receita orçamentária: todo ingresso de recurso financeiro que represente disponibilidade para o erário financiar as despesas orçamentárias;
XIV – receita corrente: arrecadada dentro do exercício, aumenta as disponibilidades financeiras do Estado, com efeito positivo sobre o patrimônio líquido do ente;
XV – receita de capital: arrecadada dentro do exercício, aumenta as disponibilidades financeiras do Estado, sem efeito sobre o patrimônio líquido do ente;"


O conceito de receita orçamentária está adequado, no entanto, os conceitos de receita corrente e receita de capital, ao tentar correlacionar o orçamento com o balanço patrimonial, introduz contradições insanáveis no texto da lei. Vejamos o artigo 3º, abaixo,

"Art. 3o O exercício financeiro coincidirá com o ano civil. Parágrafo único. Para fins da elaboração e execução da lei orçamentária, pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nele arrecadadas; e
II – as despesas nele empenhadas".


Repetindo o artigo 35 da lei 4320, define que pertence ao exercício financeiro as receitas nele arrecadadas, ou seja, para efeitos orçamentários consagra o regime de caixa para o reconhecimento e registro das receitas orçamentárias. Por outro lado, para efeitos contábeis a Norma Brasileira de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (NBCASP 16.5) estabelece o regime de competência para o reconhecimento das receitas , como se vê abaixo,

"21. Os registros contábeis devem ser realizados e os seus efeitos evidenciados nas demonstrações contábeis do período com os quais se relacionam, reconhecidos, portanto, pelos respectivos fatos geradores, independentemente do momento da execução orçamentária".


Essa contradição de regimes de reconhecimento é insanável, uma vez que, normalmente as receitas correntes de impostos tem seu momento de realização contábil no ato e momento do lançamento do tributo, que ocorre antes do efetivo recolhimento pelo contribuinte. Ora, dessa forma quando o sistema orçamentário reconhecer a receita no momento do recebimento (conceito caixa) o sistema contábil já deverá ter reconhecido essa mesma receita no ato e momento de sua realização, impactando positivamente o patrimônio líquido. O mesmo raciocínio vale para as receitas de capital. Tome-se por exemplo uma venda de patrimônio - se for à vista e pelo mesmo valor de aquisição então o montante e momento de reconhecimento coincidirá nos dois regimes caixa e competência. Caso contrário a contradição estará estabelecida.
Dar tratamento contábil às receitas orçamentárias só traz problema!!! A conceituação da lei 4320 me parece mais adequada, explicita o fenômeno, sua gênese e não entra em contradição com as normas de contabilidade.


"Art. 11 - A receita classificar-se-á nas seguintes categorias econômicas: Receitas Correntes e Receitas de Capital. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.939, de 20.5.1982)
§ 1º - São Receitas Correntes as receitas tributária, de contribuições, patrimonial, agropecuária, industrial, de serviços e outras e, ainda, as provenientes de recursos financeiros recebidos de outras pessoas de direito público ou privado, quando destinadas a atender despesas classificáveis em Despesas Correntes. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.939, de 20.5.1982)
§ 2º - São Receitas de Capital as provenientes da realização de recursos financeiros oriundos de constituição de dívidas; da conversão, em espécie, de bens e direitos; os recursos recebidos de outras pessoas de direito público ou privado, destinados a atender despesas classificáveis em Despesas de Capital e, ainda, o superávit do Orçamento Corrente. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.939, de 20.5.1982)"


b) Conceito de Despesa Orçamentária (Art. 2º)

" XVII – despesa corrente: aquela que não contribui, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital;
XVIII – despesa de capital: aquela que contribui, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital;"


A definição de despesa corrente e de capital atrelada à condição de contribuir ou não para a formação ou aquisição de um bem de capital não é adequada e além disso é insuficiente. Quanto a despesa corrente efetivamente não contribui para a formação ou aquisição de um bem de capital, mas o que dizer da despesa de capital?
Não cabe nesta conceituação as amortizações de dívidas, por exemplo. A Lei 4320 também tem essa preocupação em distinguir as despesas que concorrem para a formação de capital das que não concorrem. Mas para isso ela detalha dentro das despesas de Capital - as despesas de Investimento, as Inversões financeiras e as transferências de capital. Manter a classificação/conceituação definida pela Lei 4320 me parece mais adequado.

Detalhes


  • Fonte: Fórum ABCP
  • Mês/Ano: Ago. 2016
  • Autor: Nelson Machado

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